CONSUMO
VORAZ
por
Tatiana Martins Alméri
A
moda e sua velocidade de renovar padrões e tendências é um estimulante para um
dos principais esteios do sistema capitalista: a geração de uma cultura de
consumo voraz. É o lema do "ter" para "pertencer”
A moda atualmente consegue
sustentar uma das partes da estrutura do sistema capitalista que certamente faz
com que o fluxo financeiro continue em alta rotatividade. A moda consegue
garantir que certos produtos fiquem obsoletos em menos de quatro meses, e isso
faz com que novas compras sejam feitas e com que o dinheiro seja gasto. Essa
configuração ocorre porque as necessidades de consumo estão inseridas no dia a
dia das pessoas que fazem parte de uma estrutura global; hoje em dia não basta
consumir esporadicamente, o consumo muitas vezes é diário e pode até fazer
parte de uma terapia muito utilizada: vou comprar para relaxar.
Esse relaxamento ocorre por uma
sensação de saciedade, de necessidade cumprida, ou melhor, de buscas sanadas.
Porém, o mais espantoso de tudo é que por um momento a pessoa realmente passa
por essa saciedade, a sensação de alívio e, principalmente, de conquista. Mas
de onde vem essa sensação se muitas coisas que compramos não estão dentro das
nossas necessidades básicas? Nós realmente precisávamos daquilo naquele momento
ou ocasião?
A sensação de saciedade ocorre
porque ao consumir certamente conseguimos nos encaixar na estrutura social
vigente: a busca pelo TER. Porém, essa estrutura é momentânea e deve ser, por
essência, assim, para garantir que o fluxo financeiro novamente se concretize.
Portanto, a sensação de saciedade vai até o ponto do lançamento de um novo
produto, de uma nova moda, mesmo que ela seja algo que está retornando costumes
de décadas passadas. Assim, sentimo-nos saciados não pelo objeto em si, mas
pelo que ele significa para a sociedade, tanto no seu valor de uso, mas
principalmente como um significante social, um símbolo cultural.
Sociologicamente falando, somos construídos pela cultura. Dessa maneira, segundo Taylor, o termo cultura é "todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade" (1871, p.1). Esse conceito pode ser complementado por Kroeber (1949), o qual afirma, dentre outros aspectos, que "a cultura, mais do que a herança genética determina aspectos do comportamento humano". Cito a cultura para conseguirmos fazer um elo entre a essência do sistema capitalista, a moda e a construção do indivíduo moderno.
Sociologicamente falando, somos construídos pela cultura. Dessa maneira, segundo Taylor, o termo cultura é "todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade" (1871, p.1). Esse conceito pode ser complementado por Kroeber (1949), o qual afirma, dentre outros aspectos, que "a cultura, mais do que a herança genética determina aspectos do comportamento humano". Cito a cultura para conseguirmos fazer um elo entre a essência do sistema capitalista, a moda e a construção do indivíduo moderno.
CULTURA DO CONSUMO
As discussões sobre a cultura do
consumo trazem o dilema da fragmentação, da pluralidade, da flexibilidade e
hibridização sociocultural dos representantes das formas de vida estabelecidas
na sociedade, incluindo nesse contexto assuntos como produção simbólica,
rituais de consumo, ciclos de consumo, projetos de identidades dos
consumidores, cultura de mercado, padrões sócio-históricos de consumo e a
ideologia de mercado de mídia de massa e estratégias interpretativas dos
consumidores (ARNOULD apud OLIVEIRA; VIEIRA, 2010).
Na nossa sociedade, o sentimento
de pertencimento ao grupo social faz com que a pessoa se sinta aceita e
necessariamente não marginalizada; tanto é dessa maneira que, ocasionalmente,
quando agimos de uma forma não muito agradável ao grupo, a pena é a exclusão.
Podemos aqui apontar ainda mais fundo: quando fazemos algo ilegal a nossa
penalização, entre outras, é sermos presos, ou seja, excluídos do grupo. De uma
forma mais intensa, quando estamos encarcerados e, mais uma vez, cometemos
delitos novamente, somos retirados do grupo e colocados em uma solitária. Falo
isso para deixar bem claro o quanto é importante culturalmente pertencer a
algum grupo, ser aceito. Tanto é que socialmente a nossa principal penalização
é a exclusão, a retirada do indivíduo do grupo.
Esse sentimento de
pertencimento ao grupo está totalmente vinculado à cultura, essa sim é que faz
a construção de como nos apresentaremos socialmente, como refletiremos e
faremos a diferenciação entre o bem e o mal, de como refletiremos e faremos as
nossas escolhas. Essas escolhas que aparentemente são individuais
necessariamente sofrem uma enorme influência cultural - do grupo - e a moda é
um exemplo clássico dessa influência.
Acreditamos, dentro da
nossa "ignorância", que nós somos da maneira que escolhemos, ou seja,
livres para optar conforme o modo que achamos melhor. Porém, caro leitor,
infelizmente para alguns e felizmente para outros, não funciona muito bem dessa
maneira. Somos manipulados a cada momento, e essa manipulação acaba
condicionando as nossas escolhas; não nos vestimos simplesmente como queremos,
ou não pintamos nossos cabelos da maneira que escolhemos impreterivelmente, nós
somos manipulados a agirmos e nos vestirmos, e, pasmem, até pensarmos da
maneira que a sociedade nos impõe, o que está entrelaçado à nossa cultura ou em
uma cultura suprema.¹ Mas onde estou querendo chegar com essas afirmações?
Quero mostrar como funciona a lógica do consumo.
O consumo faz com que
um indivíduo seja inserido em um grupo; qual grupo? O grupo que consome aquele
tipo de bens ou serviços que você acaba de comprar. Ao entrarmos no grupo
inconscientemente nos sentimos satisfeitos, o que nos traz aquele momento de
saciedade, mas essa satisfação é momentânea, dura muitas vezes até o momento
que lançam um novo produto.
Quando há o lançamento
de um novo produto e não o consumimos, necessariamente saímos do grupo
(lembre-se que essa é culturalmente uma das piores penas da nossa sociedade),
consequentemente nos sentimos insatisfeitos e somos levados a realizar uma nova
compra, um novo consumo para que a entrada no grupo ocorra, a satisfação
aconteça e que o ciclo se concretize novamente.
Podemos aqui apontar um
exemplo do grupo classe média: A classe média, de maneira geral, atualmente
possui um computador em casa. Se você é da classe média e não o possui,
certamente sofrerá algum tipo de preconceito, seja no dia a dia entre gozações
com amigos até a chamada de atenção no trabalho. Depois de alguns momentos de
exclusão, você finalmente consome, compra um computador, o qual lhe insere
naquele grupo e, consequentemente, traz uma satisfação até o momento que
lançarem um novo produto que aquele grupo está consumindo, como uma calça de um
modelo novo, e é neste momento que o ciclo se configure novamente. A
insatisfação acontece, e a consequência de tudo isso? Você já sabe, o consumo
vai ocorrer.
A existência da moda é uma das grandes sacadas da estrutura
do sistema capitalista. As roupas, calçados, maquiagens, penteados, etc., mudam
no mínimo a cada estação, isso faz com que os produtos se renovem a cada
momento, mas a grande sacada desse setor é que muitas vezes podem ser
apresentadas modas espelhadas em outras épocas, o que faz com que compremos
novamente os produtos que tínhamos na década de 1970, ou seja, acabamos
comprando duas vezes o mesmo produto só que em épocas diferentes, não
necessariamente porque gostamos, mas porque o grupo social assim exige.
Cabe aqui ressaltar que a moda não trará novamente algo de
cinco anos atrás, pois se corre o risco de eu ainda ter guardado no meu armário
e, dessa maneira, não necessitarei fazer a compra. Essa é a nossa famosa lógica
do consumo, a qual está fundamentada na nossa cultura, na estrutura do sistema
capitalista, e faz com que, por intermédio de vários patamares, sendo um deles
a MODA, o fluxo financeiro continue fluindo concretizando a estrutura do
sistema capitalista.
Tatiana Martins Alméri é socióloga pela
Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, mestre em Sociologia Política e
professora na Unip e na Fatec (taalmeri2@hotmail.com).
¹Para Bauman (2001), o atual sistema
social envolve os sujeitos primeiramente enquanto consumidores, pois somos
guiados mais pela sedução e desejos voláteis, nos quais se movem as marcas e os
símbolos com uma leveza quase imperceptível nas relações sociais, do que na
constituição de laços com nossos semelhantes. Isso se evidencia a medida que os
processos de massificação do consumo e da mídia se intensificam, provocando uma
proximidade maior dos homens com seus símbolos e objetos (representações)
produzidos do que com outros homens (BAUDRILLARD, 1995). É assim que, para
Baudrillard (1995), constitui-se a cultura do consumo, marcada pela crescente
intensidade de relações entre os sujeitos e suas representações em detrimento
do entendimento da realidade vivida. Este fenômeno evidencia como se vive com
menor alusão e maior ilusão às funções sociais (OLIVEIRA; VIEIRA, 2010, p. 38).
REFERÊNCIAS
BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. Lisboa: Edições 70, 2005.
TYLOR, Edward B. La Cultura Primitiva [1871]. Madrid: Ayuso,1977- 1981.
KROEBER, A. Estudos de Organização Social. São Paulo: Livraria Martins, 1949.
OLIVEIRA; VIEIRA. Produção simbólica e sustentabilidade: discutindo a lógica da salvação da sociedade pela mudança nos modos de consumo. Universidade Estadual de Maringá. Disponível em: .
BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. Lisboa: Edições 70, 2005.
TYLOR, Edward B. La Cultura Primitiva [1871]. Madrid: Ayuso,1977- 1981.
KROEBER, A. Estudos de Organização Social. São Paulo: Livraria Martins, 1949.
OLIVEIRA; VIEIRA. Produção simbólica e sustentabilidade: discutindo a lógica da salvação da sociedade pela mudança nos modos de consumo. Universidade Estadual de Maringá. Disponível em: .
Fonte:
http://sociologiacienciaevida.uol.com.br/ESSO/Edicoes/30/artigo181646-1.asp
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