Ecad tenta se livrar da imagem de vilão e se aproximar de artistas.
ANA PAULA SOUSA
Poderia ter sido assinada por Waldick Soriano
(1933-2008) a música tema, caso música houvesse, da nova fase que o Ecad
(Escritório Central de Arrecadação de Direitos) se propõe a viver.
É quase em tom de "Eu Não Sou Cachorro,
Não" que a entidade, responsável pela arrecadação de direitos autorais no
país, tem procurado aproximar-se da imprensa, de artistas e dos bares e
consultórios médicos obrigados a pagar pelas músicas executadas debaixo do seu
teto.
"A gente tinha muita coisa para mostrar, mas
estava acostumado a só apanhar", diz Mário Sérgio Campos, gerente
executivo de distribuição do Ecad.
Campos, que trabalha no Rio, veio a São Paulo na
semana passada, acompanhado de uma assessora de imprensa, para ter
"conversas de aproximação" com jornalistas.
Entre petit fours e café, o executivo tornou
público o novo molde do discurso da entidade: "Não dizemos mais 'cobramos
porque está na lei' e ponto. Conversamos, temos outra abordagem". O que
eles fazem agora, explicou, é um trabalho de "conscientização", que
inclui manuais explicativos e diálogos mais amenos.
Por que a mudança de postura? "Porque era
antipático", responde Campos. Mas não só. "Este novo trabalho cria
pagadores fieis, que não ficam inadimplentes", diz.
COBRANÇA REPAGINADA
Instituição privada sem fins lucrativos criada
durante a ditadura militar, o Ecad reúne diferentes associações de músicos,
algumas presididas por artistas como Dorival Caymmi e Fernando Brant. Seu papel
é cobrar, arrecadar e, por fim, distribuir.
"Cobrar por uma coisa que não é palpável,
como os direitos de autor, é difícil no Brasil", diz Campos, para
justificar as críticas recebidas. "Acho que é cultural. A ideia de que
tudo pode ser livre dificulta nosso trabalho."
A atacar o Ecad há artistas que não se julgam
representados pela entidade --cuja distribuição alcançaria só os "mais
tocados" -- e empresas que se acham exploradas.
Os donos de salas de cinema contestam a cobrança
na Justiça por considerar que os produtores já pagaram os direitos autorais
durante a feitura dos filmes. Não seria cobrança em duplicidade?
"Entendo o que você fala, mas o que os
filmes nacionais pagam de direitos não é nada. E eles pagam o chamado direito
de sincronização, não o de execução da música", rebate Campos.
Enquanto os tribunais se debruçam sobre tais
tecnicidades, o Ecad vai cavando atalhos para aumentar a arrecadação. Se, há dez
anos, o pagamento feito por rádios e TVs era fundamental, hoje a proporção
mudou. Academias de ginástica, lojas, internet e hotéis contribuem cada vez
mais na conta final.
"Só metade das rádios paga direito
autoral", diz Campos. Academias de ginástica e clínicas médicas seriam,
então, uma maneira de compensar essa inadimplência institucionalizada?
"Sim".
Para minimizar o conflito com os novos alvos, o
Ecad mudou até seu vocabulário. A palavra fiscal foi trocada por técnico ou
colaborador. O antigo operador de gravação, que ficava com gravadores e
planilhas nos bares, agora tem um equipamento digital que pode ser acoplado à
parede dos estabelecimentos, e passou a chamar-se técnico de distribuição.
A tentativa de livrar-se da fama de
"vilão" é também uma prevenção contra a mudança na Lei do Direito
Autoral, em discussão no país?
"Sobre isso, só a doutora Glória [Braga,
superintendente executiva do Ecad] fala."
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